CINEMA PATRIMÔNIO

Esse é o foco luminoso que inspira as edições anuais da CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto,  fórum dedicado à preservação audiovisual em diálogo com a educação e em intercâmbio com o mundo. Uma iniciativa pioneira no circuito de festivais e mostras de cinema a agregar valor de patrimônio à sétima arte e contribuir com um olhar para a história a partir do contemporâneo.

Olhando o início, e hoje comemorando uma década de realizações, a proposta de fazer uma mostra de cinema dedicada à preservação, que parecia uma aventura, hoje é mais que um evento: é uma declaração de princípios em favor do fortalecimento do cinema nacional – polariza importantes ações de formação, reflexão, exibição e difusão que podem ser vivenciadas na conquista de um trabalho coletivo.

Em sua 10ª edição, tem como eixo temático a discussão sobre Acesso e Aacessibilidade nos contextos da preservação audiovisual, pesquisa histórica e educação, considerando que um dos maiores problemas da sociedade brasileira é o acesso aos bens culturais por ela mesma produzidos.

A preservação do cinema e do audiovisual, a iminência de perda de obras significativas do cinema brasileiro, a evolução das técnicas de restauração, o impacto da era digital, o intercâmbio, as diretrizes e estratégias de ação, o conhecimento e troca de experiências dão a tônica às discussões da CineOP, que promove, em suas edições anuais o Encontro Nacional de Arquivos e Acervos Audiovisuais Brasileiros e o Encontro da Educação que reúnem mais de 200 profissionais de vários Estados do País, para juntos, construírem o Plano Nacional de Preservação, integrar a cadeia produtiva do audiovisual com a história e a educação.

O que se entende por preservação hoje no Brasil, quais seus agentes, objetos, conceitos, formação, campos de trabalho, instituições, órgãos de classe e resultados? Convidamos você para pensar, propor, discutir e refletir os rumos da preservação na atualidade no cenário da barroca e singular cidade de Ouro Preto, patrimônio cultural da humanidade.

 ACESSO E ACESSILIDADE

Este é o conceito geral que irá nortear os debates, diretrizes, encontros da 10ª CineOP.

Duas leis sancionadas ao longo da década passada e uma há muito aspirada balizam partes das discussões e dos debates que a  CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto pretende levantar em sua 10ª  edição,dedicada à questão do negro no cinema brasileiro, na Temática História, à presença do filme nacional no ensino fundamental e médio, na temática Educação, e a um balanço de uma década de preservação, da jornada da CineOP, na Temática Preservação.

As três temáticas do evento – preservação, história e educação – convergem este ano em suas preocupações conjuntas para com o aprofundamento da inserção do negro, do saber audiovisual e da preservação junto a sociedade brasileira. Preocupam-se com estratégias, instrumentos, agentes e políticas que viabilizem transformações necessárias a uma sociedade mais justa, ativa e preocupada com seu patrimônio humano, histórico, cultural e artístico. E tem consciência de que partindo desses campos estruturantes da vida e da cultura o ponto de inflexão é o direito e o desejo de revisitação do passado, ou, em outros termos, mais conceituais e abrangentes, a afirmação do Acesso como premissa fundamental do que somos em meio à sociedade da Informação e da Acessibilidade como prática cotidiana que amplia o alcance das populações interessadas no contato com o artefato audiovisual em múltiplas manifestações.

Com as Leis 10.639/03,que institui o ensino de história e da cultura afro-brasileira e africana na escola de nível fundamental e médio, e 13.006/14, que insere duas horas mensais de filmes brasileiros como complemento educacional, criaram-se requisitos de acesso ao conhecimento que representam desafios conceituais, financeiros, técnicos, logísticos e culturais. Com a falta de legislação voltada para o universo da preservação audiovisual, a começar por uma Política Nacional de Preservação Audiovisual, bandeira histórica da CineOP e da ABPA – Associação Brasileira de Preservação Audiovisual, vêem-se comprometidas desde já a plena e qualificada fruição de todo um patrimônio audiovisual brasileiro e internacional, particularmente africano e latino- americano, que poderia alicerçar tanto o conhecimento sobre a trajetória do negro, da floresta ou savana às favelas ou telas de cinema, quanto o da própria arte cinematográfica como referência lúdica, educacional e formativa, pensando sempre que o público-alvo são os cidadãos infanto-juvenis comuns e, de maneira inclusiva, aqueles portadores de necessidades especiais.

A questão da representação do negro pelo filme nacional não é nova e compreende diferentes fases da história do cinema brasileiro. Emblemático dessa trajetória, o trabalho do ator Milton Gonçalves, homenageado na 10ª CineOP, espelha com rara clareza as conquistas, sofrimentos, contradições e simbolismos envolvidos nas diferentes personagens que interpretou e o retrato afirmativo que se formou no audiovisual brasileiro a partir de sua geração.

Nunca é demais recordar que o cinema moderno entre nós tem como ponto de inflexão a inserção do negro na sociedade e sua presença destacadas nas telas, obra de geração independente de Nelson Pereira dos Santos e seu Rio 40º,e, entre outros, Roberto Santos e seu Grande Momento, filme de estreia de Gonçalves, e depois de quase todo o Cinema Novo, com desdobramentos significativos até a atualidade. Introduzir o filme brasileiro associado ao tema ou a cultura africana e afro-brasileira na escola passa pelo conhecimento e pelo debate do ator negro, da personagem negra, da questão do negro em suas diferentes dimensões e períodos históricos.

Ao se descobrir que não existem mais os filmes de Benjamim de Oliveira, primeiro ator negro em destaque do cinema brasileiro, ou a primeira película de Grande Otelo, nome maior da cultura brasileira, ou as produções do alemão Joe Schone filmada no Rio de Janeiro, apreendidas e destruídas pela polícia porque retravam a sociedade brasileira como negra, mesma acusação dirigida a Orson Welles e ao episódio carioca de It’s all true, entende-se perfeitamente o valor da preservação audiovisual e a necessidade de ampliar seu escopo e a presença no país.

O processo educacional é um dos grandes instrumentos de correção de chagas históricas, e não só por uma política de cotas, mas também por um conhecimento e aprofundamento da história e seus desdobramentos contemporâneos. Para os integrantes da Rede Kino, empenhados em não deixar que a Lei 13.006 sofra o mesmo destino da 10.639, até hoje com baixa inserção junto à rede escolar, as virtudes do cinema, ou mais propriamente da arte cinematográfica, são suficientes para uma mobilização de debate amplos, como os que estão sendo propostos para esta edição da CineOP, desde que os instrumentos de acesso sejam adequados, a começar pela simples existência dos filmes e sua disponibilização, e que não se esqueça um alunado que requer instrumentos adicionais como legendas, audiodescrição, deslocamento pessoal ou via internet, entre outros elementos.

No campo da Educação muitas experiências históricas fornecem subsídios para um novo modelo de inserção do filme no cotidiano escolar, como é o caso do Cineduc, instituição pioneira da America Latina no ensino do audiovisual para crianças e adolescentes, que completa 45 anos e será homenageado na CineOP, e da Escola Internacional de Cinema e Televisão de Santo Antonio de Los Banos, em Cuba, que completa 30 anos de ensino superior de cinema. São instituições experientes e que conseguiram gerar metodologias de aproximação e inserção do universo audiovisual junto a públicos escolares os mais variados. Mais do que isso, atuaram para a valorização do filme como produto artístico e cultural, perspectiva fundamental na relação a ser proposta entre cinema brasileiro  e escola brasileira, não transformando esta última apenas em mais um mercado de consumo do produto audiovisual, como aconteceu por muitos anos com o livro. Questões como seleção e contextualização do filme brasileiro e preparação do docente para lidar com as dimensões históricas, artísticas e culturais do segmento se afiguram centrais e serão tema dos debates dos encontros em trono da lei.

Para a Temática Preservação é chegada a hora de um balanço não só da CineOP, como fórum privilegiado do setor, examinando-se suas contribuições e lacunas, por meio do Encontro Nacional de Arquivos, de debates, diálogos e de um livro reflexivo sobre essa trajetória, mas do próprio segmento como um todo, na medida em que os avanços sobretudo legais fora muito pequenos nos últimos 10 anos. Há o que comemorar, como a mobilização da área, a fundação ABPA, a aproximação ao Estado, a criação de editais, um grande conjunto de restaurações, a criação ou melhoria das reservas técnicas, a realização de trabalhos de pós-graduação, a introdução de um formação voltada para este campo do conhecimento, a troca de informações, publicações, conhecimentos e a apresentação de um conjunto de reivindicações que constitui amadurecimento formidável quanto aos objetivos, rumos e conquistas à frente. Criou-se também um grande grupo, de notável camaradagem e grande afinação quanto à importância da luta por uma melhor preservação audiovisual no Brasil, na qual a CineOP desempenha o papel de espaço privilegiado e símbolo e Fernanda Coelho, homenageada da preservação, é exemplo de vida e trabalho dedicados à preservação audiovisual no Brasil, mantendo vivo o ciclo da memória do cinema nacional.

Estas questões dão a tônica das temáticas preservação, história e educação da 10ª CineOP, que de 17 a 22 de junho, reunirá no centro dos debates mais de 50 profissionais do audiovisual, da preservação e educação para discutir os caminhos e desafios que norteiam o Acesso e Acessibilidade em diálogo com a preservação e a educação.

Exibições de mais de 100 filmes em pré-estreias nacionais e retrospectivas, homenagens, debates, seminário, Encontro Nacional de Arquivos, Encontro da Educação:VII Fórum da Rede Kino, oficinas, programa Cine-Expressão, Mostrinha, Cortejo, Exposição, Lançamento de Livros, Shows e atrações artísticas.

HOMENAGEADOS
Milton Gonçalves – Temática Histórica
Fernanda Coelho – Temática Preservação
Cineduc – Cinema e Educação – Temática Educação

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Coordenação Geral – Raquel Hallak
Coordenação Adjunta – Fernanda Hallak e Quintino Vargas
Temática Preservação – Hernani Heffner
Temática Histórica – Cleber Eduardo
Temática Educação – Adriana Fresquet
Seleção de longas contemporâneos – Francis Vogner dos Reis
Seleção de médias e curtas contemporâneos – Francis Vogner dos Reis e Pedro Maciel Guimarães