MÃE TERRA, TERRA SAGRADA
Pioneira desde sua criação (2006) a enfocar a preservação audiovisual, memória, história e a tratar o cinema como patrimônio, a CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto chegou a sua 14ª edição, de 5 a 10 de junho de 2019, reafirmando o propósito de ser um instrumento de reflexão e luta pela salvaguarda do rico e vasto patrimônio audiovisual brasileiro em diálogo com a educação e em intercâmbio com o mundo.
Idealizada pela Universo Produção para estar a serviço da preservação do patrimônio cinematográfico brasileiro e da educação, a CineOP foi acolhida de imediato por instituições, técnicos, pesquisadores, historiadores, colecionadores, jornalistas e colaboradores, que a elegeram fórum de reflexões e encaminhamento de ações do setor da preservação. Tornou-se palco de encontros, discussões e decisões do setor de preservação, que clama por atenção e políticas públicas em um mundo hiperacelerado e tecnológico, que muitas vezes se esquece ou negligencia sua própria história.
Estrutura sua programação em três Temáticas de atuação: Preservação, História e Educação, que convergem a cada edição em suas preocupações conjuntas para o aprofundamento de fatos históricos, do saber audiovisual e da preservação junto à sociedade brasileira. Preocupam-se com estratégias, instrumentos, agentes e políticas que viabilizem transformações necessárias a uma sociedade mais justa, ativa e preocupada com seu patrimônio humano, histórico, cultural e artístico. Cada temática com um enfoque e discussões próprias, que se aproximam em mesas e atividades propostas.
Na Temática Preservação, o eixo central foi “A regionalização e a formação do patrimônio audiovisual brasileiro”. Com curadoria de Ines Aisengart Menezes e José Quental, o recorte destacou ações e políticas regionais direcionadas à preservação do patrimônio audiovisual brasileiro e os desafios enfrentados por instituições de salvaguarda, tendo por base os arquivos regionais descentralizados e deu o tom das discussões do 14º Encontro Nacional de Arquivos e Acervos Audiovisuais Brasileiros. Os debates enfocaram também a difusão e formação de plateias, os arquivos e os aspectos de mercado,o uso das tecnologias e contribuíram para ampliar a troca de experiências e o intercâmbio com instituições de guarda e profissionais do setor da preservação. Uma das presenças internacionais mais aguardadas foi a da francesa Cécile Petit-Vallaud, diretora da Cinemateca de Bretanha, que possui um dos acervos regionais mais importantes da França.
O eixo central da Temática Histórica foi “Territórios regionais e inquietações históricas”. A programação assinada pelos curadores Francis Vogner dos Reis e Lila Foster buscou novos apontamentos sobre a dimensão regional da produção brasileira. Teve o propósito de pensar a ideia de território e as novas perspectivas da história do cinema, entendendo como é possível, em um país de dimensões continentais, pensar as particularidades das regiões e dos territórios que compõem o Brasil. Neste contexto se inseriu a homenagem ao cineasta baiano Edgard Navarro, um destaque artístico da cena brasileira que, ao longo de sua trajetória, produziu uma obra de grandeza única e original no cinema brasileiro.
Já na Temática Educação, assinada pelas curadoras Adriana Fresquet e Clarisse Alvarenga, o foco foi “Mulheres: terras e movimentos” e teve o propósito de refletir durante a programação do Encontro da Educação: XI Fórum da Rede Kino (Rede Latino-Americana de Educação, Cinema e Audiovisual) a atuação das mulheres no campo do cinema e da educação, tendo como ponto de partida o vínculo com a terra, com os territórios e espaços que elas ocupam na sociedade.O Encontro da Educação valorizou o cotidiano escolar, dedicando atenção para refletir sobre a inserção feminina da mulher dentro do cotidiano escolar, utilizando o cinema para discutir e alterar o contexto de violência, exclusão e invisibilidade que historicamente acompanha a mulher brasileira – tendo por consequência altos índices negativos, com grande número de subempregos, exploração e assassinatos.
A programação abrangente e gratuita apresentou ao público, nessa edição, 103 filmes (12 longas, 4 médias e 87 curtas), vindos de 15 estados brasileiros (AC, AM, BA, CE, DF, ES, GO, MG, MS, PE, PI, PR, RJ, RS e SP) e 2 países (Argentina e França), distribuídos em MostrasTemáticas: Homenagem, Contemporânea, Preservação, Histórica, Educação, Mostrinha e Cine-Escola. E apromoção de oficinas, workshop, debates, encontros, exposição, cortejo da arte, lançamento de livros, shows e atrações artísticas que ocuparam três espaços ouro-pretanos: o Cine Vila Rica, o Centro de Artes e Convenções e a Praça Tiradentes – principal espaço público da cidade.
A revolução da tecnologia da informação, a transformação dos hábitos culturais, a multiplicação de canais, plataformas, redes e serviços interativos deram o tom da complexidade dos desafios enfrentados pelo setor audiovisual num mundo globalizado. Mais do que nunca precisamos estar atentos e imbuídos do propósito de salvar nossas imagens e reconhecer sua importância como matéria-prima de cidadania.
No mundo de convergências tecnológicas, o que estamos fazendo para salvar nosso patrimônio audiovisual?
Quando vamos presenciar a implantação de uma política pública de preservação capaz de salvaguardar o rico patrimônio fílmico brasileiro?
Em quais territórios nosso cinema é preservado, fomentado, exibido e difundido?
O que as futuras gerações conhecerão da produção atual?
Como construir ferramentas e informações para a pesquisa e o acesso do público em tempo presente?
Qual espaço pertence ao cinema brasileiro?
Entre questões e contradições. Transições e aberrações.
Entre avanços e retrocessos. Hostilidades e desprezos
Entre a vida e a morte. O passado, presente e futuro.
O que cabe a cada um de nós neste Brasil contemporâneo?
Mais uma vez, o cinema se tornou, também, um instrumento poderoso que define e ajuda a dar identidade ao país, que nos faz pensar e agir, resistir e ocupar, almejar e sonhar, transgredir e progredir, querer ir e ficar. Mais uma vez, o cinema nos deu a certeza de que janelas se abrem, caminhos florescem, obras existem para serem desvendadas, posições para serem firmadas e espaços para serem descobertos.
Acreditamos que a conjugação de esforços e o diálogo entre a preservação audiovisual, a história e a educação representam uma iniciativa de vanguarda e, ao mesmo tempo, necessária como ação estratégica e fundamental para o desenvolvimento de uma nação. Preservar e dar acesso constitui uma atitude política rica para a produção do conhecimento em que a memória e a educação, caminhando juntas,abrem novas perspectivas para criar novos mundos possíveis.
Agradecemos aos parceiros, lideranças políticas e empresariais que assumiram o compromisso de assegurar a realização dessa edição da CineOP num momento em que a cultura e a educação clamam por reconhecimento e respeito, afinal são alicerces que retratam o modo de vida de uma sociedade, sua história, valores e complexidade e mantêm acesa a chama da vida do conhecimento num mundo em constante processo de transformação.
Em território mineiro e barroco, espaços e comunidades se somam, pessoas se juntam e dão sentido a este encontro anual que estabelece posturas e representa uma declaração de princípios em favor da diversidade social e humana deste imenso país.
A todos que se dispuseram a colaborar com suas reflexões, presença, trabalho, experiências e dedicação, nossa imensa gratidão!
Estamos aqui porque acreditamos no território sagrado que nos une e dá sentido aos nossos ideais e à nossa existência.
Raquel Hallak d’Angelo
Quintino Vargas Neto
Fernanda Hallak d’Angelo
Diretores da Universo Produção e Coordenadores da CineOP